Naquele dia de sol adusto,
No botequim, leis companheiros,
Ridentes quais boêmios augustos,
Entoavam seus cantos domingueiros;
Afinadas, as armas cadentes,
Desde o pandeiro ao fulvo violão,
Preludiavam as notas quentes
Da harmonia da triste canção.
Cingindo aquela mesa rotunda,
O encargo animava os cantadores
De fazer da tarde moribunda,
Uma flor a recender amores.
E, perante os jovens uma sombra
Espreitava a airosa cantoria,
Como a leoa atenta na alfombra
Observa o vagar de sua cria.
Um homem dolente e acabrunhado,
Cismando – não se sabia – na hora.
Bebia aflito um cognac gelado...
Fumava o cigarro de quem chora.
No fim da música predileta,
Aplaudia querendo partir,
E, sorrido à plêiade irrequieta,
Pedia p`ra canção repetir.
A plêiade, exibindo talento,
Continuou a cantar fremente
Os versos que ao homem – sofrimento –
Trazia a cada acorde estridente.
Contava pungente o som mordaz
O traiçoeiro destino de Adão,
Que por causa de uma serpe sagaz,
Do paraíso teve a expulsão.
Que por sua carência de siso,
Condenou a todos ao pecado,
E do mundo injusto o rude friso,
Impeliu-nos quando foi prostrado.
Tal qual um Baudelaire que profana,
O choroso homem se perguntava:
- Por que a desventura é soberana?
E, repetindo a questão arfava.
Até que em veneta ele falou,
Porque lhe afligia o torvo canto.
Sentido, sua vida contou,
Afogado em profundo quebranto.
Disse-lhes que seu amor eterno,
A rainha de toda a beleza,
Por um vão motivo e sempiterno
Deixou-lhe, na dor e na tristeza.
Por isso, lembrava-lhe a cantiga
O abismo que a ilusão nos forjou...
O homem deixou a plêiade amiga
E o botequim, cansado da vida.
No dia seguinte, se matou!
ALEXANDRE CAMPANHOLA
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